A criatividade é sempre associada com liberdade, expansão da consciência, mas enquanto atividade humana também deve ser regida pelo ordenamento jurídico, com os limites necessários para não extrapolar o bom senso e ferir princípios como a dignidade da pessoa humana.
No caso da criatividade usada na Publicidade, deve-se observar as regras da legislação em Comunicação e outras leis associadas ao exercício do publicitário. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) surgiu no final da década de 70 para avaliar se o anúncio publicitário poderia ser veiculado nos jornais, revistas, televisão e rádio, por intermédio de códigos de conduta e princípios éticos.
Com a criação do Código de Defesa do Consumidor, em 1990, o órgão passou a verificar também a sintonia com os princípios desse código. Entretanto, a criatividade humana, juntamente com o desenvolvimento de Novas Tecnologias, sempre traz mais desafios, pois a ânsia de expansão criativa tenta ser mais ágil e driblar as nuances das leis.
Recentemente, o uso da Inteligência Artificial (IA) na campanha Volkswagen Brasil – 70: o Novo Veio de Novo utilizava a imagem da cantora Elis Regina, que morreu há mais de 40 anos e aparecia cantando a música Como Nossos Pais, de Belchior. O “renascimento artificial”, ao lado de sua filha Maria Rita, gerou polêmica. O Conar instaurou processo ético para investigar o caso pelo fato de a peça publicitária não ter alertado que as imagens foram produzidas com IA.
Os filhos da cantora autorizaram o uso, assim não houve dano aos direitos da personalidade, conforme o código civil e a constituição federal, artigo 5º. Entretanto, faltou informar nessa campanha publicitária que houve a utilização da inteligência artificial, conforme artigo 36 do Código de Defesa do Consumidor, causando uma espécie de publicidade clandestina, aquela que não pode ser imediata e facilmente reconhecida como merchandising em novelas e filmes.
Bom salientar que o Conar não é um órgão do poder judiciário. Agências de publicidade e emissoras de rádio compõem esse órgão que conta com a assessoria de advogados. Informar a um criativo que ele precisa conhecer as leis para o processo de criação das peças publicitárias remete ao papel daquela mãe chata que vai dando palpites e orientações no desenvolvimento dos filhos, mas que realmente é necessária, pois pode desencadear processos com indenizações milionárias para as empresas que contratam as agências e os publicitários.
Esse é o caso, por exemplo, da publicidade na internet que fere a Lei Geral de Proteção de Dados, Lei 13.709/2018, em vigor desde 2020. A criatividade pode brilhar respeitando as leis que têm o objetivo de assegurar a proteção das pessoas. Esse é o desafio do publicitário consciente do seu papel de despertar desejos e ações nos indivíduos.
Antoniella Devanier Lopes é Mestre em Comunicação e Semiótica, coordenadora do curso de Publicidade da Estácio Bahia, advogada e escritora.