Após edição cancelada em 2020, evento promove 240 horas de programação gratuita, diversa e para todos os públicos
Neste sábado (16), às 19h02, Rodrigo Negão fará uma viagem de volta ao passado. Nesse horário, o ator e cantor, envolvido com teatro, circo e música, será um dos artistas do espetáculo “Ngunzo”, gravado no Kilombo Manzo Ngunzo Kaiango, comunidade tradicional de terreiro e importante reduto da cultura e religião afro-brasileira, localizado, desde os anos 1970, entre os bairros Santa Efigênia e Paraíso, na região Leste de Belo Horizonte.
Inédito, o show, cujas influências passeiam pelo rap, pela música eletrônica e pelo cancioneiro popular, foi concebido especialmente para a Virada Cultural, evento que, após o cancelamento em 2020, devido à pandemia, retorna ao calendário da capital em formato majoritariamente online (detalhes da programação no fim da matéria). A apresentação reúne artistas de BH, entre eles Tamara Franklin, Imane Rane, Ana Martins e Paulo Guzambe.
Para Rodrigo Negão, que é filho de santo de Mametu Muiandê, a matriarca do quilombo, abrir a Virada ocupando um espaço tão significativo para a história de resistência do povo negro de BH é especial e simbólico: “Um show como esse é voltar lá no começo da história desse lugar, uma espécie de caminho de volta para casa. Ter artistas pretos sendo gravados onde foi, pela importância e história do local, ligado à nossa ancestralidade, que pulsa o tempo inteiro, é uma reflexão para a cidade”.
Sobre o repertório do espetáculo, que será transmitido no palco Vira Estação, dura em torno de uma hora e 20 minutos, Negão diz que o público vai conferir músicas de celebração às divindades. “E misturamos isso com a nossa linguagem e assuntos que vemos na vida urbana”, completa. Segundo o MC, são canções que falam de amor, luta e espiritualidade: “A gente chama de encruzilhada de linguagens, que, no nosso entender, é a matriz dos ritmos afro-brasileiros. Montamos um repertório a partir das canções de cada artista e que têm a ver com o universo que tentamos compreender”.
Conectados
Após passar em branco em 2020, por causa da pandemia, a Virada Cultural agora migra todo o seu conteúdo para as plataformas digitais. Embora a flexibilização na capital mineira esteja avançando, a preocupação da prefeitura era evitar aglomerações, essência do evento, que, em seu modelo original, ocupa as ruas do centro de BH. Em janeiro deste ano, a Secretaria Municipal de Cultura e a Fundação Municipal de Cultura abriram o edital para a realização da Virada Cultural e a escolha da organização da sociedade civil parceira na produção. Desde então, o desenho do evento vem sendo construído.
Em julho, foi a vez de abrir chamamento público aos artistas da capital e da região metropolitana. As propostas selecionadas receberam um cachê. Com atrações que passeiam por teatro, artes visuais, dança, música, intervenções urbanas, gastronomia, moda, bem-estar e saúde, literatura, games, cinema e teatro, a Virada 2021 pretende deixar a marca do início da retomada das atividades culturais na cidade após tempos brabos de pandemia.
É o que diz a secretária de Cultura de BH, Fabíola Moulin: “Colocamos muito essa retomada como tema, como questão. Cultura viva, vibra e vira, com a ideia de retomada desse momento presente, desse desejo de ocupar de novo os espaços, ainda que tenhamos o modelo virtual. No entanto, o número de artistas que a Virada reúne movimenta a cadeia produtiva da cultura na cidade”.
Segundo Fabíola, o foco no artista local e o fomento à produção de quem tanto sofreu com a paralisação do setor são outras características deliberadas do evento neste ano. “Fizemos questão de pensar nesses artistas de forma que eles pudessem ser remunerados realizando e divulgando seus trabalhos”, ela afirma.
Embora as atenções estejam voltadas para os artistas da cidade, há também atrações de outros estados, como o show de Ângela Ro Ro, destaque do festival Divina Maravilhosa, parceiro da Virada Cultural. Ro Ro interpreta os sucessos da carreira, tocando um piano de cauda em pleno Viaduto Santa Tereza, com o cenário icônico dos arcos sobre a Praça da Estação. A apresentação será transmitida no sábado, às 22h07, no palco virtual Vira Guaicurus.
Ao vivo e presencial
A Virada Cultural terá parte da programação realizada ao vivo e presencialmente, caso de intervenções que não envolvem aglomeração. Mulher trans, preta e favelada, como se orgulha em dizer, Mari Flô Canuto vai pintar o mural “Travesty sob Muro” ao vivo, neste domingo (17), a partir das 10h, na fachada do Centro de Referência das Juventudes (CRJ), no centro de BH.
Moradora do Morro das Pedras, Mari criou a obra para a Virada. Desde 2015, a artista trata sobre ancestralidade e corpos de mulheres periféricos e marginalizados. “Esse trabalho tem o viés das diversas mulheridades e é um reflexo do meu corpo, da minha ação e dos meus movimentos. Vejo o corpo das mulheres da minha família e do Morro das Pedras como possibilidade de existência. Ao falar delas, falo de mim também”, comenta a grafiteira.
Mari Flô diz ainda que, ao deixar sua arte no muro, ela também crava uma mensagem importante: a de tirar o estereótipo marginal e sexual do corpo da mulher trans: “Quero mostrar para outras mulheres trans que é possível ser referência por meio da arte. Somos pessoas com desejos, sonhos. A sociedade resume a mulher trans a um corpo sexual, bizarro, quando, na verdade, ela é uma mulher que só quer viver a vida dela”.
Virada em números
R$ 1,5 milhão é o orçamento da Virada Cultural 2021, com recursos da PBH
240 horas de programação em dez canais virtuais
329 atrações
Mais de 1.500 pessoas envolvidas diretamente no evento, entre artistas, produtores, técnicos e profissionais de comunicação
Programas
Com dez palcos virtuais – Vira Geek, Vira e Faz, Vira Saia, Vira Virou, Vira Praça Sete, Vira Pipoca, Vira Guaicurus, Vira Estação, Vira Lata e Vira Mix –, a Virada Cultural começa às 19h deste sábado e termina no domingo no mesmo horário. A programação é gratuita e será transmitida pelo canal da Fundação Municipal de Cultura no YouTube. Informações e detalhes sobre as atrações estão disponíveis em viradacultural.pbh.gov.br ou no Instagram do evento.
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