Guiado por temas profundos como suicídio, luto e conflitos familiares, novo espetáculo da Cia Teatro Independente estreia na capital mineira nesta sexta (22)
No começo de 2021, quando a quarentena da Covid-19 começava a fechar as portas dos teatros e espaços culturais dentro e fora de Brasil, a peça “Pá de Cal (Ray-Lux)”, da Cia Teatro Independente, que estava agendada para estrear em Belo Horizonte na ocasião, precisou ser adiada.
A pausa forçada de quase dois anos acabou criando uma grande expectativa ao redor do espetáculo escrito por Jô Bilac, autor considerado pela crítica especializada como um dos expoentes da nova dramaturgia brasileira.
Agora, após meses de ensaios virtuais e diante da reabertura gradual em tempos de quase pós-pandemia, a montagem, enfim, desembarca na capital mineira para curta temporada, a partir desta sexta-feira (22), no palco do CCBB, na Praça da Liberdade.
Em cena, “Pá de Cal (Ray-Lux)” investiga as tensões internas de uma família que se vê forçada a lidar com o suicídio de seu membro mais jovem. A tragédia expõe os conflitos, segredos e histórias que envolvem os personagens e traz à tona divergências alimentadas por cada um deles ao longo dos anos.
“A peça questiona as convenções sociais que atribuem valores aos modelos esvaziados das relações humanas e a nossa capacidade em terceirizar nossas responsabilidades emocionais”, explica Jô Bilac.
Toda a ação se passa na casa do pai do morto, local que é foco de uma disputa judicial entre os parentes. Durante a trama, os familiares – que não comparecem ao velório, mas são representados em cena por seus advogados, maridos e ex-companheiras – tentam fugir de suas responsabilidades e acabam pintando com suas ações um dramático retrato das relações humanas e seus percalços.
“Normalmente é a família quem cuida dos seus mortos e ritualiza suas dores para transcender o trauma. Mas aqui buscamos um ângulo novo e convidamos o público a conhecer esses personagens e todos os seus fantasmas”, acrescenta Bilac.
Com um elenco formado pelos atores Isaac Bernat, Carolina Pismel, Orlando Caldeira, Pedro Henrique França e Ruth Mariana, o texto remete aos melhores momentos da obra de Nelson Rodrigues (1912-1980), que é uma das grandes influências na carreira de Jô Bilac.
“Sou grande admirador do Nelson, que é quem sempre me norteou na dramaturgia”, conta o dramaturgo, em tom de admiração. “Ele tinha uma sensibilidade fascinante que o permitia lançar um olhar preciso sobre a realidade brasileira para encontrar não só as nossas contradições, mas também a beleza violenta da nossa alma”, resume.
Investigação da alma
Através de diálogos bem montados e cheios de humor, a montagem se destaca justamente por falar abertamente sobre questões complexas e de caráter existencial.
O diretor Paulo Verlings justifica as particularidades do enredo e diz que a história busca demonstrar as emoções mais intensas da família sob uma ótica atual.
“Achamos importante discutir o quanto nós hoje, na contemporaneidade, passamos muito das nossas obrigações e relações para terceiros”, aponta Verlings, que também é o responsável pelo argumento e idealização da peça.
Segundo ele, a peça é uma tentativa de discutir temáticas inquietantes no palco, como a morte, a culpa, o suicídio, e a ausência de diálogo e afeto.
“A gente quis colocar uma lente de aumento diante destes assuntos difíceis com o intuito de investigar um pouco a alma humana”, frisa Verlings. “Se conseguirmos tocar as pessoas de forma profunda e fazê-las refletir sobre tudo isso, já é um grande lucro”, conclui.
Comemoração
A encenação de “Pá de Cal (Ray-lux)”, marca os 15 anos de existência da Cia Teatro Independente. Formada em 2006, a trupe carioca se destacou no cenário nacional por montagens premiado e reconhecidos como “Cachorro!” (2007) e “Rebu” (2009).
“A Cia Teatro Independente cultiva um DNA diverso. Cada um trabalha em seus rolês à parte e depois de anos a gente volta para a sala de criação com as vivências que tivemos”, diz Jô Bilac, que é um dos fundadores do grupo ao lado dos atores Carolina Pismel, Júlia Marini e Paulo Verlings, que também atua como diretor da companhia.
“E ‘Pá de Cal’ fala essencialmente disso: a natureza do diálogo dos encontros. O humor e a tragédia são traços que identificam a gente não só como grupo, mas revela também uma identidade que reflete os paradoxos do nosso país, da nossa sociedade, da vida”, finaliza.
Serviço
O quê: “Pa de Cal (Ray-Lux)”
Quando: De 22 de outubro a 15 de novembro, sempre de sexta a segunda às 20h
Onde: No Centro Cultural Banco do Brasil, na Praça da Liberdade
Quantos: Ingressos custam de R$ 15 a R$ 30 e podem ser adquiridos no site do CCBB
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