CRÔNICA
“Abelha Rainha: faz-se em mim”
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Publicado em 12 de março de 2024 às 10:08
Maria Bethânia Crédito: Lara Mangieri
Após muita expectativa ao longo dos anos para conseguir vê-la ao vivo, no sábado, eu estive frente a frente, corpo e alma, com Maria Betânia, em um show inesquecível em SP.
Ainda em êxtase é que escrevo. A voz de Betânia é histórica, presença atemporal. Tem a força da ancestralidade, a imponência dos Orixás e a benção de todos os Santos da sua terra. Atravessa-nos, transpassa o peito e nos revira ao avesso. Abelha Rainha, ferroa e adoça, lidera. Traz leveza, na suavidade da melodia e na originalidade dos arranjos, sem perder o ímpeto de sabedoria que lhe é peculiar. Hipnotiza, energiza, conecta.
Ao fechar os olhos, éramos apenas eu e ela, o silêncio rasgando-se pelo arrepio que nos traz a pele, o desejo de aquietar e bailar. Betânia faz ecoar a força da sua natureza mulher para nos acordar na nossa humanidade, é ética e estética. Conduz-nos ao não dito, às entrelinhas, aos desejos e medos, aos graves e suaves tons da existência. A primeira emissão é um susto – para onde estaria ela, tão grandiosa, nos levando? E então, sem resistências, envoltos pelo encantamento das reticências , nos permitimos adentrar a escuta poética, redescobrirmos canções, histórias, batuques e ritmos. Tem veemência a percussão , repercute em nós, faz até a tristeza dançar.
E, Sem nos poupar, ao final ela nos deixa com o embalo generoso, fazendo-se presente em nós ao nos convocar, em uníssono, a seguir adiante, cantando com tudo e apesar de. Saímos todos à capela e ali estava posto um milagre : o do Renascimento pelo canto de tantas vozes. Saravá!