O céu nublado em Belo Horizonte era mais um sinal do luto. Às 17h25 de terça-feira (9), o caixão com o corpo do sargento da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) Roger Dias da Cunha, de 29 anos, foi sepultado no Cemitério Bosque da Esperança, no bairro Jaqueline, na região Norte da capital. Familiares, amigos e centenas de integrantes das forças de segurança de Minas – bombeiros, policiais militares, civis e penais – saíram até de outras cidades e lotaram o local para se despedir, com aplausos, do colega.
Há dez anos na PM, Dias foi covardemente assassinado durante o trabalho. Ele fazia uma perseguição a bandidos na noite de sexta-feira (5), no bairro Novo Aarão Reis, na região Norte de BH, quando um dos suspeitos reagiu e atirou à queima-roupa. O sargento foi baleado duas vezes na cabeça e uma na perna. O crime foi registrado por câmeras de vigilância. O suspeito, de 25 anos, que tinha sido beneficiado pela “saidinha” temporária do sistema prisional para o Natal e o Ano-Novo, foi preso com o comparsa, de 33 anos.
O sargento chegou a ser socorrido por colegas para o Hospital Risoleta Tolentino Neves. Gravemente ferido, ele precisou ser transferido para o Hospital João XXIII, onde faleceu dois dias depois.
Tristeza
Durante o velório, a microempreendedora Ana Carolina Viana, de 30 anos, contou emocionada, e ainda sob o sentimento de revolta, sobre o amigo de infância que perdeu. “O Roger (Dias) era um homem muito bom. Um amigo incrível. Ajudava muita gente. Era um pai apaixonado pela filha, completamente apaixonado pela esposa. Ele aprendeu o que era responsabilidade desde muito novo, porque ele não tinha outra escolha. E foi por isso que ele escolheu a polícia”, contou.
Ana ressaltou que, apesar de trabalhar com uma arma, Dias só pensaria em atirar em alguém em última instância, porque era obediente às regras. “Ele sempre deixou claro que nunca atiraria em um homem ou em um bandido se realmente não tivesse um perigo iminente. E foi isso o que ele fez”, lembrou.
Em sua trajetória na PM, o sargento Dias sempre trabalhou no operacional e era considerado um policial experiente. “Além de constantemente ser treinado para fazer abordagens – é uma matéria longa durante a preparação –, ele era um policial experimentado de rua, experiente, trabalhava no grupamento especializado. A rotina dele era fazer abordagens”, disse a major Layla Brunnela, porta-voz da PM.
A família, muito abalada, não quis falar com a imprensa. Durante o sepultamento, a viúva do sargento Dias, Ana Clara, guardou, para a filha de 5 meses, a bandeira do Brasil usada para cobrir o caixão do militar no velório. O tecido, ela explicou, será entregue quando a menina crescer, para mostrá-la “o herói que o pai dela foi e o pai incrível que ela teve”. “Por pouco tempo, mas ele foi incrivelmente maravilhoso”, disse.
Na quarta-feira (10), a PMMG informou que o sargento Dias terá direito à promoção post mortem, isto é, uma progressão de carreira como homenagem. A família dele receberá a pensão.
Suspeito volta ao regime fechado
O homem de 25 anos acusado de efetuar os disparos que mataram o policial aproveitava a saída temporária de fim de ano da cadeia. Ele cumpria pena de 16 anos por ocorrências relacionadas a furtos e roubos. Na terça-feira (9), o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) revogou o regime semiaberto para o detento. Agora, ele vai voltar para o regime fechado.
“Nós só queremos que a morte dele não seja em vão. Queremos que mexam na Lei de Execução Penal e acabem com todas as regalias desses presos. O Roger não teve saída”, disse Ana Carolina, amiga do Sargento Dias.
Já o comparsa, de 33 anos, possui três condenações por roubo. Ele também é suspeito de homicídio consumado e tentativa de homicídio qualificado. (Juliana Siqueira)
Eu protesto contra ela
No velório do sargento Dias, no Cemitério Bosque da Esperança, o clima era de revolta entre os colegas e familiares do policial morto. “Vidas policiais importam” e “O sargento não teve ‘saidinha’”, diziam faixas colocadas no local, em protesto contra a Lei de Execuções Penais, que permite que presos em regime semiaberto saiam temporariamente.
Na avaliação do comandante geral da Polícia Militar de Minas Gerais, coronel Rodrigo Piassi do Nascimento, os tiros que vitimaram o sargento Dias deverão provocar reflexão no país sobre a lei.
“Eu gostaria que todos os parlamentares assistissem ao vídeo em que o sargento Dias foi vitimado. Precisamos muito que esse triste exemplo seja utilizado na discussão das leis que regem não só esse assunto, mas vários outros”, protestou.
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