Chinelo encontrado no Museu do Ipiranga. Foto: Reprodução.
O objeto é feito de borracha, e seus contornos carcomidos lembram o pé esquerdo de um ser humano. Da espuma que forma a base, saltam tiras resistentes, adornadas em relevo com pequenos traços geométricos. Um dia, elas estiveram dispostas mais ou menos como a letra V do alfabeto ocidental. Hoje, encontram-se partidas.
Nas laterais e na forquilha, o artefato apresenta uma mesma coloração incerta, algo entre o azul e o verde-escuro. Ele tem uma face amarela e outra cinzenta. Antes do desgaste, do desbotamento e da exposição contínua à sujeira, suas cores talvez fossem diferentes.
Os especialistas garantem: estamos diante de um chinelo de dedo.
O modelo remete às Havaianas, fabricadas desde 1962 pela Alpargatas. Para o design da mercadoria, a empresa buscou inspiração nas antigas zōri, sandálias que acompanham os quimonos e outras vestimentas tradicionais japonesas. Os primeiros anúncios publicitários, veiculados já naquele ano, prometiam “beleza, conforto e resistência” para famílias de classe média, reunidas à beira de piscinas ou em frente a televisores modernos.
A publicidade, contudo, não impediu os pobres de aderirem ao produto. Seu uso rapidamente se estenderia à vida pública e ao trabalho braçal, por vezes envolvendo imitações de preço inferior e procedência desconhecida — como este pé, sobre o qual se debruça uma equipe técnica multidisciplinar.
A sola gasta, com um prego enferrujado dando sustentação à extremidade de uma das tiras, é um marcador socioeconômico. Embora a vida útil do produto já tivesse chegado ao fim, seu dono driblava a aquisição de um novo par.