Passados 126 anos da inauguração de uma das cidades planejadas do Brasil, quem mora em Belo Horizonte convive com questões que não entraram no projeto inicial da nova capital de Minas: horas perdidas no trânsito, transporte coletivo insuficiente e lotado, além de poluição sonora. Drama enfrentado diariamente por quem faz a cidade pulsar. Para moradores e comerciantes, a BH do futuro precisa, primeiramente, ter o mínimo para garantir qualidade de vida para a população.
Mineira de nascimento e belo-horizontina de coração, a auxiliar de limpeza Rilma Margarida, 58, conta que adotou a capital mineira como sua há mais de 20 anos. O amor pela cidade, entretanto, não encobre os perrengues vividos no cotidiano. “Todo dia é uma luta. Os ônibus estão sempre lotados, e eu vou sempre em pé, mas tem dias que nem consigo entrar”.
O que já é rotina para Rilma surpreendeu o paulista Thiago Rodrigues, 26. “BH não tem um transporte que atenda o ritmo mais acelerado da cidade”, avalia. Morador do Aglomerado da Serra, na região Centro-Sul, ele não consegue utilizar o metrô. “Pego dois ônibus. Não tem uma linha direta. Se tivesse, poderia ser 30 a 40 minutos. Mas tem dias que gasto duas horas e meia”, reclama o universitário.
As dificuldades não diminuem o amor pela cidade, mas, para Rilma e Thiago, a BH do futuro precisa garantir um transporte coletivo de qualidade. “Quero uma cidade que pense muito nas pessoas e nos coletivos, que pense que há regiões que precisam de mais atenção com necessidades específicas”, enfatiza Thiago.
Engrenagem está na favela
Para que os progressos ocorram, no entanto, é preciso, primeiro, entender quem move a cidade. A avaliação é do líder social Júlio Fessô, nascido e criado no Morro do Papagaio, na região Centro-Sul de BH. “Quem faz o PIB girar e BH se mover é a engrenagem que está na favela. Se o favelado não desce para fazer o pão, não tem pão quentinho. Se o favelado não desce para tirar o lixo, o prédio fica sujo. A favela é parte fundamental para BH”, afirma.
Do outro lado da cidade, na região da Pampulha, moradores sonham com o fim da “perturbação do sossego”. Presidente da Associação Pró-Interesse do Bairro Bandeirantes (Apib), Adrienne Arantes Moore clama por uma cidade onde prevaleça o respeito ao próximo.
“A BH que a gente imagina pode parecer utópica, mas é uma cidade mais ordenada, com local próprio para bairro residencial e outros para restaurantes e eventos. A capital foi desenhada para tranquilidade e de repente virou um inferno. A parte financeira está acima do respeito ao cidadão. Nós pagamos impostos, e não somos respeitados”, reclama.
Capital da Gastronomia Criativa precisa rever políticas para bares
Com 178 bares a cada 100 mil habitantes, conforme o Censo 2022, BH se consolidou como a capital dos botecos, o que torna os estabelecimentos essenciais para a economia e o turismo. Relevância que não os blinda dos gargalos da mobilidade, conforme avalia a presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de Minas Gerais (Abrasel-MG), Karla Rocha. “Principais problemas são transporte público e falta de mão de obra. Precisamos encontrar esse equilíbrio em relação às políticas urbanas de ruído, por exemplo. O que traz o turista para BH é a nossa gastronomia, nós somos o setor que mais emprega”, afirma.
A mesma situação é listada pelo vice-presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), Marcos Innecco, que aponta a “oportunidade” como caminho para as melhorias. “Quanto mais vibrante economicamente é, quanto mais emprego e oportunidade, mais qualidade de vida tem”, finaliza.